Taberna… mas pouco.
É um dos fenómenos do ano (mesmo tendo começado ainda em finais de 2018) e tem gerado boas conversas à volta de uma mesa: as novas tabernas modernas. Não são as tascas modernas/petiscarias que tiveram o seu boom há cerca de 4 ou 5 anos atrás, nada disso. São novas “tabernas”, projectos de jovens Chefs, provenientes de outros restaurantes, e que abrem espaços em nome próprio (mesmo que não seja mesmo o seu nome no toldo). Espaços onde recriam o verdadeiro ambiente de uma tasca genuína, assim como a comida de tasca. Ou, pelo menos, é assim que se querem ver. O resultado final, no entanto, acaba por gravitar num limbo estranho… o espaço parece uma taberna, os pratos são cozinha de autor. Mesmo que sejam baseados em pratos tradicionais, acabam por ser tão trabalhados que perdem o carácter genuíno que lhes querem transmitir. E por isso o conceito perde-se… quase totalmente.
Seguindo em frente. Um desafio de Instagram para escolherem um restaurante a visitarmos levou-nos até à Taberna do Calhau. Projeto relativamente recente do Chef Leopoldo Garcia Calhau, é também um dos spots mais falados do ano, tanto entre Chefs e a comunidade “foodie” de Lisboa, como entre o normal visitante de restaurantes. Uma taberna a sério, comida alentejana genuína, enfim, era um dos restaurantes que tínhamos em lista para visitar, por isso calhou bem.
O espaço fica na Mouraria, a uns 10 minutos a pé (e a subir) do largo do Martim Moniz e, como não tem sinaléctica na porta, é ir com atenção. Ou seguir as pessoas e o barulho, porque também dá logo para perceber.
Ao entrar percebemos que o restaurante está cheio, mas também percebemos que tem só assim “meio” de taberna. As mesas e cadeiras cumprem, o resto é demasiado minimalista, está mais próximo de um registo de Chef. Há um barulho agradável no ar, e até podia sentir-se o vibe das tabernas/tascas à antiga. Mas percebemos que mais de metade da casa está ocupada por turistas que vieram aqui ter à procura da “experiência genuinamente portuguesa” – é engraçado, mas conseguimos perceber isso pelos guias e pelas conversas que ouvimos à nossa volta.
A ementa tem muita coisa, sendo que percebemos pelos preços que se tratam de doses para partilhar, algumas que serão mais tipo entradas e outras mais a tocar no prato principal. Tínhamos algumas referências dadas por amigos que já lá tinham ido, mas olhamos para a ementa ainda assim, com muita indecisão.
O Chef Leopoldo vem à mesa, simpático, e a sua recomendação são os best sellers do menu. Não eram necessariamente todos os que tínhamos idealizado, mas quando é o Chef a recomendar, à partida teremos uma boa experiência. E a primeira recomendação é o Camarão e Tremoço. Ora, trata-se de um bisque de camarão com uma quenelle de tremoço picado no meio. Nada de errado com os sabores, que são bons e complementares, mas diria que a dose é pequena. Pelo menos para contar como um prato.
Terminamos este prato em menos de 1 minuto… e depois ficamos 20 minutos à espera do segundo prato. A Raia e Coentros é uma espécie de açorda à alentejana, onde a raia substitui o bacalhau, e é um prato muito saboroso. Há um bom equilíbrio de sabores e a frescura proveniente dos coentros, mas aqui novamente a quantidade podia ser maior (até porque é um prato que custa 12,5€, ou seja, já não é uma entrada)..
Depois da raia, mais 20 minutos até ao prato seguinte. Ora, esta espera quase cronometrada de 20 minutos entre cada prato tem ainda outro efeito para além de nos deixar impacientes: deixa-nos também desconfortáveis. Porque é muito engraçado ter mobiliário de taberna à antiga, fica muito bem nas fotos… mas nas tabernas à antiga eu não demorava 2 horas a jantar.
O prato seguinte é um dos mais falados naquilo que se escreve sobre a Taberna do Calhau: a “famosa” Alentejaninha. Um pedaço de carne de porco preto com um molho com toques de molho de francesinha. Uma ideia interessante, sem dúvida. Mas o problema é que o prato chega à mesa com o a carne morna e o molho frio. Não é morno, é frio. E frio quase nem tem sabor… Chamamos a empregada, perguntamos se é suposto ser assim, dizem-nos que não e levam o prato de volta. No seu regresso, a Alentejaninha vem com a carne mais quente… mas o molho exactamente igual. Percebemos que não vamos ganhar esta guerra, comemos, o Chef passa pela mesa e pergunta se à segunda o prato já estava bom, nós dizemos que estava frio na mesma, ele vai dar na cabeça de um dos cozinheiros (a cozinha é aberta e conseguimos ver isso). Porreiro, mas comemos o prato frio.
Entretanto, e quando esperamos pela troca do prato, comentamos um com o outro algo que já tínhamos reparado desde cedo no jantar. Há outras mesas (poucas) a serem servidas com uma cadência muito mais rápida que a nossa. Curiosamente, mesas com pessoas que claramente conhecem o Chef e o resto do staff. Mas, se calhar, é só coincidência…
Felizmente, no que diz respeito à comida, o melhor dos pratos recomendados fica para o fim. Iscas e Uvas, combinação que não conhecia, mas que combina muito bem. Há um contraste de sabores muito interessante neste prato, que sim, já nos remete para a cozinha de conforto que estávamos à espera desde o início do jantar.
A única vantagem (se é que lhe podemos chamar isso) de ver algumas outras mesas a serem servidas muito mais rápido do que a nossa é que uma delas chega primeiro ao momento do pagamento… e parece-nos que lhes dizem que não há multibanco. Oi?! Pois… azar o nosso, mas nesse dia o multibanco não esteve a funcionar o dia todo. Mas esperem… nós reservámos mesa por telefone a meio da tarde, será que não nos podiam ter informado? Ou mesmo quando nos sentámos, que tal dar essa informação? Porque a caixa multibanco mais próxima é na Praça do Martim Moniz, cerca de 10 minutos a descer… e depois a subir. Daí termos visto pessoas de algumas mesas a sair e depois a regressar. Pá, nem vou pôr em questão se isto foi um problema só naquele dia ou não, mas é inadmissível que não sejamos informados disso ou na reserva ou na chegada. Até porque nem toda a gente anda com 80€ na carteira para pagar um jantar…
E por causa deste “contratempo”, passaram-se mais 20 minutos até pedirmos a sobremesa, que já sabíamos qual ia ser por causa das recomendações. O que não sabíamos era que o Pudim de Noz da Joana custava 7,5€. Ok, percebo que é de noz e as nozes são caras. E admito que é um belo pudim, com uma textura entre isso e um bolo. Mas 7,5€ é mais caro do que algumas sobremesas em restaurantes de cozinha de autor. Ah, espera…
E pronto, esta foi a nossa experiência na Taberna do Calhau. Até admito que possamos ter tido azar… mas foi demasiado azar junto. E além do azar com os pratos, há as questões de serviço, para as quais simplesmente não encontramos uma explicação razoável. E isto condiciona a experiência, pela negativa. Uma experiência com um ticket de 35€ pessoa. Numa “taberna”, a comer doses pequenas, sem o mínimo conforto, a esperar 20 minutos entre cada prato.
A realidade é que queríamos muito ter gostado mais da Taberna do Calhau, porque a grande maioria dos “foodies” e malta da gastronomia que conhecemos adora o sítio. Se calhar até nos ficava melhor ter simplesmente tirado fotos e não emitir a nossa opinião sincera. Mas não conseguimos ser assim… A Taberna do Calhau até tem coisas interessantes a nível de pratos mas depois falha no conceito e em questões mais práticas que não podem ser ignoradas. No fundo, foi uma pequena decepção… em praticamente tudo.
Preço Médio: 35€ pessoa (com vinho)
Informações & Contactos:
Largo das Olarias, 23 | 1100-376 Lisboa | 21 585 19 37