Há aqui sabores bem apurados!
Há restaurantes que são incontornáveis em Lisboa, especialmente quando se fala de tipos específicos de comida. Cada um pode ter os seus restaurantes preferidos, é verdade, mas há nomes que são mais ou menos transversais a todas as opiniões. E no que respeita a restaurantes que exploram a gastronomia indiana e afins, o Jesus É Goês é desse tipo de sítios: aparece em todos os guias e está na ponta da língua da maioria do pessoal que escreve sobre comida.
O Jesus É Goês é, como o próprio nome indica, um restaurante goês. E o dono/chef chama-se… adivinhem… é isso mesmo, Jesus. É a sua figura que vemos em vinil na porta do pequeno restaurante, e é a própria pessoa que vemos frequentemente a sair da cozinha com pratos ou simplesmente para ver como estão as coisas na sala. Imponente mas simpático.
Então vamos à comida. É verdade que, como já escrevi muitas vezes (e não tenho vergonha em admitir), para mim a comida goesa, indiana, nepalesa e afins é toda assim mais ou menos parecida. Consigo perceber as diferenças, é claro, mas anda tudo ali no mesmo registo, com variantes de caril, sabores intensos, muitas especiarias e quase sempre as mesmas proteínas. Por isso, é sempre interessante olhar para uma ementa que tem um conjunto de pratos que não reconhecemos!
A indecisão é grande, mas felizmente o grupo também… e a fome, já agora. Por isso podemos pedir várias coisas, entre entradas e pratos principais. E começamos desde logo no Jesus é Goês com o Bhajipuri, que anda ali no meio entre pão e panqueca, mas feito de batata, para comer tipo um taco, recheado com o Puri que vem a acompanhar (que é uma mistura de batata, vegetais e especiarias). Uma excelente surpresa para começar o jantar.
Depois, as clássicas e inevitáveis Chamuças, aqui em duas versões: as de Carne, boas, picantes qb, e as de Camarão, mais cremosas, um pouco mais picantes ainda, diferentes do que é habitual. Em ambas, boa massa, semi-estaladiça, saborosa. Muito bons também os Boges com Chutney de Coentros: boges são uma espécie de pataniscas com ervilhas, fofa e bem frita, servida com um chutney saboroso mas que tem a textura mais de uma pasta do que de um chutney verdadeiro.
Ora, se nas entradas já temos oportunidade de ver coisas diferentes daquilo que existe na grande maioria dos restaurantes indianos (e afins), é nos pratos principais que percebemos melhor as subtis (e não só) diferenças entre a comida goesa que o Jesus faz aqui e os pratos que encontramos noutros espaços. Há bases nossas conhecidas, é verdade… mas depois os sabores não têm nada a ver!
E podemos começar logo com o nosso prato preferido da noite: o Had Mass são pequenos pedaços de piano cozinhados num molho intenso, carnudo, ligeiramente picante, de lamber os dedos (ainda que não seja um prato de comer à mão). Há uma enorme profundidade neste molho, sentimos diversas dimensões, muito mais do que num caril normal.
Todos os pratos foram sugestões, e acertaram todos na mouche. O Caril de Camarão com Quiabos é um dos pratos mais pedidos do restaurante e percebemos porquê: o caril é muito saboroso (ainda que seja mais próximo dos sabores a que estamos habituados), e depois o camarão e especialmente os quiabos dão um toque exótico ao prato. Mas ainda partilhamos o Cafreal de Frango (uma espécie de caril com um sabor acentuado de coentros, um prato mais fácil a nível de sabor) e o maravilhoso Xacuti de Cogumelos e Castanhas, que é descrito na ementa como tendo 11 especiarias, e que por isso tem um sabor brutal! As castanhas também ajudam muito a dar riqueza e textura ao prato, mas é o molho que se destaca mesmo.
No fundo, aquilo que sentimos é que a mão do Chef Jesus faz milagres a nível dos sabores (perceberam o que fiz aqui?). Há uma densidade enorme em cada prato, e isso percebe-se logo quase pelo seu aroma. É assim que imaginamos ser a cozinha goesa genuína.
Mas depois as sobremesas seguem por um caminho diferente… Com a excepção da Bebinca, que é bastante boa, as outras sobremesas são mais elaboradas, com apresentações e sabores que se afastam da intensidade que temos nos restantes pratos.
Por um lado, temos o Doce de Chocolate, que é uma espécie de gelado de chocolate, com folhas de hortelã e peta zetas. É bom, muito bom, mas nada exótico nem nos parece que seja algo de muito genuíno (mas não podemos pôr as mãos no fogo, claro). Por outro lado, o Gelado de Manga e Maracujá do Jesus é uma sobremesa completamente elaborada, com uma apresentação demasiado complicada e também demasiados sabores e texturas, resultando numa pequena confusão. O ponto baixo da noite, na nossa opinião.
Mesmo depois de sobremesas menos genuínas do que esperávamos (e do desconforto que é o restaurante não ter multibanco, o que é uma coisa que efectivamente não se percebe nos dias de hoje…), a nossa opinião sobre o Jesus É Goês é bastante positiva, especialmente por causa do resto da comida. Sabores muito apurados, pratos diferentes do que esperávamos, e outros que não provámos mas sobre os quais ficámos com muita curiosidade. Há um vibe muito grande em torno deste pequeno espaço, sempre houve, e se formos pela comida e mesmo pelo ambiente, é completamente justificado.
Preço Médio: 25€ pessoa (com cerveja)
Informações & Contactos:
Rua de São José, 23 | 1150-352 Lisboa | 920 091 826
Não tem Multibanco.