Um laboratório de ideias, com resultados excelentes!
Não há assim tantos Chefs que nos façam realmente sair da nossa zona de conforto. A maioria domina bem as técnicas e o empratamento, sabe escolher os produtos mais frescos e da época… mas depois nem todos dão o salto para nos mostrar coisas que desconhecemos. Aquele produto de que nunca ouvimos falar, aquela conjugação de ingredientes que não estávamos à espera, enfim, coisas que à partida nunca escolheríamos numa ementa simplesmente por desconhecimento. Isso não acontece assim tão frequentemente.
Por isso é que quando ouvimos falar da abertura do Estória, com a presença do Chef Vitor Areias, ficámos entusiasmados, mas também um pouco de “pé atrás”… mas ainda bem que fomos surpreendidos! O espaço não é demasiado formal, o serviço não é demasiado “chique”, a comida não é demasiado “sofisticada” e os preços são muito mais acessíveis do que seria de esperar. Ok, há ainda pormenores a rever, como a iluminação demasiado clara ou o serviço pouco explicativo dos pratos (e muitos precisam de ser explicados), mas estamos a falar de um restaurante que abriu há apenas um mês.
Aquilo que percebemos quando lemos a ementa é que o Chef Vitor Areias não tem medo de experimentar com produtos diferentes. São produtos da época, aquilo que há no mercado, coisas das quais muita gente nunca ouviu falar mas que estão entranhadas na cultura gastronómica portuguesa.
Por isso é que saímos da nossa zona de conforto e não pedimos o camarão para entrada nem as bochechas de porco alentejano para prato principal. Em vez disso, arriscamos… e é uma viagem!
Começamos com uma espécie de sopa de lingueirão com ovo e espuma de alho, um caldo cheio de sabor, com a espuma de alho a dar-lhe um contraste excelente de acidez. A outra entrada é o prato da noite, e provavelmente a melhor entrada que comemos este ano! Os boletus frescos salteados com acelgas são assim algo de magnífico, porque sentimos toda a frescura da terra naqueles ingredientes, numa combinação tão simples mas ao mesmo tempo tão perfeita. Até a louça ajuda a tornar este prato numa experiência magnífica!
Seguimos em frente com duas recomendações do Chef: o alguidar de veja com chips de nhame de massa sovada, o peixe fresquíssimo e tudo de uma simplicidade e técnica incrível; e o rabo de boi envolto em couve com espuma de cogumelos, que também parece tão simples mas está tudo cozinhado na perfeição, a carne a desfazer-se e os contrastes ácido/doce a transportarem-nos para memórias de almoços de família. É isto que surpreende mais na cozinha do Chef Vitor Areias: podemos não saber o nome de alguns dos ingredientes, podemos ficar surpreendidos pela apresentação, mas a conjugação de sabores é-nos muito familiar.
Houve espaço ainda para as sobremesas, onde temos uma delícia de chocolate com maracujá que deveria ter mais maracujá para cortar o doce excessivo do chocolate… e outra maravilha, o abade de priscos com laranja e vinho de Carcavelos, uma delícia onde tudo se conjuga na perfeição!
Um ponto a melhorar é realmente a explicação dos pratos, que quando feita pelo Chef ganha uma dimensão diferente da que temos quando é feita pelos empregados de mesa. Porque aqui há tanta coisa diferente e boa que merece realmente uma estória a apresentá-la!
O Estória é, acima de tudo, um restaurante arrojado. Não é consensual nem vai agradar a todos, mas também não me parece que seja isso que o Chef Vitor Areias pretende. Aqui temos uma experiência gastronómica fora do comum, mas ainda assim muito nossa. Temos produtos diferentes mas sempre frescos, temos uma técnica irrepreensível na forma de os preparar e temos ainda a apresentação cuidada que se espera num restaurante de autor. Mas a tudo isto junta-se o ambiente descontraído e um Chef que sabe o que quer e como o servir, de forma humilde. O Estória pode ser um laboratório de ideias, mas facilmente se vai transformar numa referência na nova cozinha de autor nacional.
Preço Médio: 30€ pessoa
Informações & Contactos:
Rua Sacadura Cabral, 54 | 1495-700 Cruz Quebrada | 211304406
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