Street food do Peru? Onde?
Pois que voltamos sempre à mesma história: tem tudo a ver com as promessas que os restaurantes fazem e as expectativas que isso cria nos clientes. Vamos a um restaurante porque nos é prometida alguma coisa que nos chama a atenção, por isso esperamos que isso aconteça. E quando não acontece é normal que exista alguma frustração. Ora, foi assim que saímos do Amaru, o novo peruano trendy do Cais do Sodré: frustrados. Por que o Amaru dá nas vistas, é verdade, mas bate um bocado na trave naquilo que é mais importante: cumprir a promessa que nos faz.
Porque o nome completo do Amaru é Amaru – Peruvian Street Lab. E aquilo que promete é street food peruana. Yap, isso mesmo. O que é uma promessa pelo menos inovadora, já que o que a maioria dos peruanos com que nos cruzamos por cá servem maioritariamente (ou quase em exclusivo) ceviches, algumas causas, um ou outro prato de carne e pouco mais. Street food, daquela que se come na rua, com a mão? Nope, isso não encontramos por cá! Por isso é normal que fiquemos com curiosidade.
Pois, só que não é bem assim… O que temos de street food no Amaru (seja ela peruana ou seja de que país for) é pouco, ou quase nada. Porque se isolarmos os Anticuchos (pequenas espetadas), as Salchipapas (já lá vamos) e o El Cochinito (uma sandes de cachaço de porco), tudo o resto são pratos normais que encontramos em qualquer restaurante peruano. E que no Peru não se comem na rua.
Mas pronto, mesmo que a promessa base não fosse cumprida, ficaríamos mais satisfeitos com o nosso jantar no Amaru se a comida tivesse sido inesquecível. Ou vá, acima da média. Mas o problema é que nem foi isso que aconteceu, com pratos bons e outros nem por isso, e com um dos piores Pisco Sour que já bebemos em Lisboa – faltou-lhe completamente o factor “sour”, era doce demais, ao ponto de nenhum dos dois terminar o cocktail e passar logo para a cerveja.
Na comida, começando pelos destaques pela positiva. O melhor prato da noite foi o Lomo Saltado, um salteado de carne de vaca com cebola roxa, tomate e pimentos. Não é um prato desconhecido para nós, mas aqui destaca-se não só pela qualidade da carne, muito tenra, como porque tudo está muito apurado e saboroso.
Ainda antes do Lomo tínhamos ficado bastante contentes com os Anticuchos de Pollo, aqui sim no registo de street food. Bem servidas estas espetadas, carne sem nada a apontar, boa salsa para acompanhar. Mas terminaram aqui os pratos que nos impressionaram pela positiva.
Porque para começar pedimos também aquilo que não conhecíamos mesmo da ementa, as Salchipapas. Descritas como salsicha de porco fumada e apimentada, com batata doce frita, ketchup e maionese (caseiros). Ora, já sabíamos que ia ser uma mistela que parece feita por uma criança de 6 anos, mas o que não esperávamos era que a salsicha parecesse aquela que se compra embalada no Continente, que as batatas doces fritas fossem das congeladas, ou mesmo que o ketchup e a maionese parecessem dos industriais. É certo que pode ser apenas a nossa percepção, mas já comemos demasiadas vezes batata doce frita desta para sabermos quando é congelada… e em relação à salsicha, se era fumada e apimentada, então tudo isso perdeu-se na curta viagem da cozinha até à mesa.
Depois, a maior expectativa esta no Ceviche Puro, até porque percebemos logo que não valia a pena continuar a pensar que íamos ter street food peruana. Aqui servido com corvina em leche de tigra, milho (ou antes, canchita frita), batata doce, cebola roxa e aji amarillo. Nada de errado nos ingredientes, mas tudo errado com o leche de tigre, muito longe daquilo que provámos na Cevicheria ou mesmo no Segundo Muelle. Falta-lhe acidez, intensidade, vida. O resto dos ingredientes estão perfeitos, mas sem o leche de tigre a unir tudo, o prato perde a sua dimensão exótica. E isso é mesmo uma pena.
A sobremesa que pedimos fica ali no limbo entre os pratos bons e os outros que nem por isso. O Cuatro Leches evolui do célebre Trés Leches sul americano, com um bolo fofo que teoricamente devia saber um pouco a pisco (só que não), doce de leite, nata batida, molho de leite condensado e gelado de nata salgada. É gordo como se quer, tem texturas diferentes, mas não é surpreendente ao ponto de terminarmos a refeição com um “Uau!”.
De resto, o sítio tem pinta, não há que negar. Alguns neons para dar um aspecto mais moderno-trendy ao espaço, luzes fortes a criar um ambiente maio tech, pequenos focos seccionados em cada mesa. As paredes em pedra contrastam com estes pormenores, criando um ambiente mais ou menos cosy, que podia ser mais se a música não estivesse tão alta. Boa playlist, ainda assim.
Peca o serviço, talvez por ter aberto há pouco tempo – ou porque é mesmo assim, e naquela zona da cidade não é preciso fidelizar clientes, porque os turistas fazem a casa. Lento, descoordenado, pouco informado. A demora é tão grande no bar como com a cozinha, o que nem sequer faz muito sentido, e enquanto estamos de braço no ar a tentar chamar a atenção, está o staff no balcão do bar a rir e a conversar.
Estamos naquela fase pós-pandemia em que tudo o que abre de novo na restauração de Lisboa (ou do Porto, pelo menos) é motivo de inúmeras notícias, como se se tratasse da última Coca-Cola do deserto. É a força da comunicação, por um lado, e também a necessidade de mostrar que o sector está vivo e de boa saúde. Mas isto cria um problema ao consumidor de restaurantes como nós: como é que escolhemos onde vamos jantar? Porque tudo tem uma promessa diferente, tudo é vendido como sendo fantástico… mas depois percebemos que anda toda a gente a repetir fórmulas e, pior do que isso, a fazer promessas que não conseguem cumprir. E isso é muito irritante…
O Amaru – Peruvian Street Lab não é um mau peruano, é apenas um peruano normal. Mas aberto numa zona de muito turismo e com todos os apontamentos de decoração que fazem com que esteja sempre cheio. Se cumpre a promessa da street food peruana? Não, nada disso. E se o que achámos dos pratos até pode ser subjectivo, o facto do conceito do restaurante estar ao lado que que anuncia já não é subjectivo. É “apenas” a comunicação a tentar enganar-nos.
Preço Médio: 30€ pessoa (com 1 pisco sour)
Informações & Contactos:
Rua de São Paulo, 204 | 1200-429 Lisboa | 918 373 210